terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Dos sobreiros à Ginjinha é tudo uma questão de regras

«Vamos todos cantar em coro: se não houver regulamentação, não há corrupção. Poderíamos também cantar, dentro de uma lógica semelhante: se não houvesse meteorologia, não haveria chuva». Rui Tavares, no Público, a revelar uma vez mais a fragilidade dos argumentos favoráveis à bondade irrestrita da iniciativa privada sem regras. O problema dos famosos sobreiros, árvore pouco querido para os lados do Largo do Caldas, «estava no excesso de regulamentação: se os sobreiros não fossem uma espécie protegida, e se o seu abate não fosse controlado pelas entidades competentes, os empresários não precisariam dos políticos para nada. A lógica é imbatível: sem regulamentação não haveria necessidade de corrupção. É evidente que sim: mas também não haveria sobreiros». Nem sequer haveria qualquer instituição económica. Este excelente artigo termina em meio urbano, passando pela reaberta Ginjinha do Rossio: «a maior parte dos leitores nem saberá que a Ginjinha voltou a abrir e, como é natural, as intoxicações alimentares que não se apanham nunca chegam a ser notícia». A direita intransigente fica muito irritada sempre que se revela que o mercado só pode funcionar de forma decente no quadro de um sistema de regras que requer apertados mecanismos públicos de monitorização. Desaparece a «mão invisível» e a sua suposta magia. Aliás, e talvez não por acaso, esta expressão, popularizada pelos supostos seguidores de Adam Smith, só aparece uma vez no seu mais conhecido e volumoso livro - A Riqueza das Nações.

1 comentário:

Fernando Vasconcelos disse...

O modelo liberal no pressuposto que queremos uma sociedade decente e justa repousa para além dos mercados livres em dois pontos cruciais:
1) Ninguém pode ter poder para manipular o mercado
2) Tem de haver uma entidade externa, não sujeita ao poder económico que seja capaz de introduzir no mercado os factores (custos) externos ao mesmo que nós enquanto sociedade queremos defender (o ambiente é um deles mas há muito mais externalidades a considerar).
Eu até sou liberal no sentido que defendo uma organização baseada na livre iniciativa e no mercado livre mas parece-me hoje claro que nenhum das condições que acabei de enunciar se verificam. É por isso que os grupos financeiros e económicos efectivamente governam o país porque manipulam o mercado e controlam de facto o poder politico logo deixando de existir efectivamente a forma mais eficaz de distribuição de riqueza e de utilização de recursos.