domingo, 8 de junho de 2008

Quem resiste à lógica e à realidade?

Diz-se muitas vezes (ver, por exemplo, VPV no Público de 7 de Junho) que o problema do estado providência é que o «dinheiro deixou de chegar para a espécie de vida que ele instaurara». É estranho. Na realidade, o «dinheiro» não tem parado de crescer. Entre 1980 e 2006 nos 31 países que integram o grupo das «economias avançadas» do FMI, o produto interno bruto mais do que duplicou, enquanto a população aumentou apenas 18%. Mais ricos per capita portanto. Como é que economia actual pode ser menos capaz de prover a protecção na doença, no desemprego e na velhice de que uma outra duas vezes mais pequena? Falta de dinheiro, ou outras prioridades?

6 comentários:

F. Penim Redondo disse...

Tentemos uma explicação razoável.

A população aumentou 18 % mas os cuidados que recebe (numero de exames de diagnóstico e medicamentos, por exemplo) cresceu, por hipótese, cinco vezes.
Assim é como se a população tivesse crescido 5X18%=90%.
Suponhamos, adicionalmente, que o preço dos serviços médicos cresceu, em média, para o triplo.
Então temos um dispêndio que cresceu 90%X3=270%.

Quanto é que disseram que tinha crescido o PIB ?

Anónimo disse...

"...mas os cuidados que recebe (numero de exames de diagnóstico e medicamentos, por exemplo) cresceu, por hipótese, cinco vezes..."

Se for esse o caso então o que na realidade acontece é que vivemos num estado mais social que em 1980.
Seria interessante saber se esse é o caso, parece-me à primeira vista que não.

Caro Castro Caldas,

"Como é que economia actual pode ser menos capaz de prover a protecção na doença, no desemprego e na velhice de que uma outra duas vezes mais pequena?"

Esta é uma duvida que me acompanha à bastante tempo e que não obtive resposta. Faz-me confusão que numa economia em expansão exista cada vez menos dinheiro para assegurar "a espécie de vida que ele instaurara".
Julgo que era interessante começar-se a discutir uma reforma fiscal, pois parece-me que o modelo actual está a ficar obsoleto (nomeadamente devido às alterações demográficas) e permite que se "gaste" dinheiro em obras e outros gastos que têm um beneficio muito duvidoso para a sociedade (nomeadamente obras públicas, por exemplo as muitas rotundas).

F. Penim Redondo disse...

Proponho um exercício interessante, ver qual foi o crescimento dos gastos com o SNS em percentagem do PIB desde 1980.

Depois pode comparar-se com o crescimento da população

João Dias disse...

Suponhamos que os impostos cobrem 5 vezes mais sectores de mercado do que cobriam, e suponhamos que os serviços/produtos médicos estão sujeitos a imposto Estatal, parece que a inflação dos medicamentos é também sentida na receita do Estado. Suponhamos que o Estado não privatizava a Galp que dava lucros anuais que compensavam largamente a sua venda, suponhamos que o Estado taxava o lucro, suponhamos que o Estado quebrava o sigilo bancário.
Eu também gosto de supor, mas prefiro a realidade, porque é essa que, acho, que queremos mudar.

Não há volta mesmo a dar, a democracia e o Estado têm sempre instrumentos para fazer os ajustes necessários. São prioridades, não são partidas do destino, nem o fado de adoecer, são prioridades...

P.S. E dá sempre um jeitão ignorar o fundamental, é que as mais valias, o lucro, o "bling-bling" está a aumentar só que está a fugir ao PIB.(Off-shores, lucro sagrado não tributável, especulação, desregulação)
90% da riqueza em 5% da população, isto deve querer dizer qualquer coisa.

F. Penim Redondo disse...

Não vamos lá (nós, a esquerda) com simplimos e slogans.

As cotadas do PSI-20 ( PT, BCP, SONAE, BES, etc.) atingiram lucros recorde em 2005, subindo cerca de 85% face a 2004.Os resultados líquidos obtidos davam para financiar uma vez e meia o aeroporto da Ota. As mais-valias e os resultados extraordinários financeiros foram decisivos para esta "performance".

Até parecia chegada a altura de os ricos pagarem a crise no entanto o Governo anunciou no mesmo ano, 2005, o défice das contas do Estado ascendeu a 8.800 milhões de euros. Ou seja, a totalidade dos lucros dos 20 maiores potentados económicos portugueses só cobre cerca de metade dos "prejuízos" do Estado.

Os números de 2005, tal como os de 2007, mostram que certas palavras de ordem vão ter que ser repensadas para não andarmos a propalar ilusões com base em objectivos irrealizáveis.

Já é altura de percebermos, nós todos os que nos reivindicamos da esquerda, que isto só lá vai com um novo tipo de sociedade, não só mais justa mas também incomparávelmente mais produtiva.

João Dias disse...

Mais uns "simplismos e slogans":

Esqueceu-se de referir um "pequeno pormenor", as maiores empresas da bolsa portuguesa (PSI-20) devem muito do seu lucro ao investimento público, ou seja os seus lucros estão directamente ligados à divida pública.

BRISA
Mota Engil
REN
Portugal Telecom
EDP
Galp Energia

E estes são os nomes mais óbvios, porque na realidade mais grandes empresas do PSI-20 vivem do investimento público veiculado pelo Estado. Portanto o crescimento da dívida pública e os lucros do PSI-20 estão directamente relacionados.

Além disso, esqueceu-se também de referir a fraca contribuição das empresas do PSI-20 para diminuir a despesa do Estado. E falamos de IRC (ver link), porque os lucros reais não são taxados.

Ainda a bater na tecla da produtividade? Você sabe que a produtividade dos portugueses cresce mais que os salários reais?