terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O esquerdismo na Europa após a guerra fria (III)

Finalizo a reprodução da minha coluna do Público, 19/1/2009, intitulada “O esquerdismo na Europa após a guerra fria”, onde, baseado em Luke March, abordei o perfil das várias correntes “esquerdistas” e as razões do seu sucesso (ou insucesso) relativos.

Cada grupo de partidos (isto é, os “partidos da esquerda radical” e os “partidos da extrema-esquerda”) é depois subdividido em várias famílias, mais precisamente cinco, embora alguma delas pertençam apenas a um dos dois grandes grupos. Nomeadamente, os “renovadores comunistas” (Partido Comunista da Boémia e Morávia, Refundação Comunista/Itália, PCE, AKEL/Chipre e PCF) estão todos no campo da “esquerda radical”; os “comunistas conservadores” (KKE/Grécia, Partido Comunista da Eslováquia, PCP e Partido Comunista da Letónia) estão todos na “extrema-esquerda”. Assim também, os “socialistas democráticos” (Aliança de Esquerda/Finlândia, o Partido de Esquerda/Suécia, o Partido Socialista Popular/Dinamarca, os Socialistas de Esquerda/Noruega, o Movimento da Esquerda Verde/Islândia, o BE/Portugal e a Coligação “Synaspismos”/Grécia) estão concentrados na “esquerda radical” (só a Aliança Vermelho-Verde/Dinamarca está na “extrema-esquerda”). Juntando o Die Linke/Alemanha e o Partido Socialista Holandês/SP, incluídos na família dos “socialistas populistas”/“esquerda radical”, temos os quatro subgrupos que abarcam o maior (22) e mais relevante leque de partidos.

Vejamos o que os diferencia. Os “comunistas conservadores” caracterizam-se por se autodefinirem como marxistas-leninistas, por apresentarem uma visão pouco crítica da herança soviética, por se organizarem na linha leninista do “centralismo democrático” e por verem o mundo pelo prisma do conceito de “imperialismo” (dos tempos da guerra fria) – apesar de inflexões nacionalistas e populistas. Os “renovadores comunistas” descartaram grande parte do modelo soviético, nomeadamente o “centralismo democrático”, e têm adoptado grande parte da herança da nova esquerda após 1968 (feminismo, ambientalismo, democracia participativa, estilos de vida alternativos, etc.).

Os “socialistas democráticos” definem-se a si próprios como simultaneamente críticos do “totalitarismo comunista” e da “social-democracia de pendor neoliberal”, abraçando plenamente não só as causas da nova esquerda mas também uma abordagem “não dogmática” e, em muitos casos, “não marxista” do socialismo, abraçando ainda as causas da nova esquerda após 1968. A corrente dos “socialistas populistas” segue idêntica linha mas junta-lhe abordagens anti-elite e anti-establishment.

Apesar da sua subrepresentação no leste, a maioria dos países têm partidos esquerdistas cuja performance têm estabilizado ou crescido desde os anos 1980. Os mais bem sucedidos são os que conheceram uma significativa evolução ideológica e estratégica: superaram o dogmatismo e têm quadros carismáticos e pragmáticos que se centram em tópicos de campanha específicos e conjugam a sua acção institucional com a luta extraparlamentar. Os mais bem sucedidos, nomeadamente os “socialistas democráticos”, promovem uma agenda “eco-socialista” e tentam influenciar os social-democratas pela esquerda, nomeadamente participando em (ou apoiando) governos. E se é verdade que há alguma erosão resultante dessa participação, ela não é na maioria dos casos significativa e, sobretudo, “tais perdas não são piores do que aquelas que ocorrem quando estão na oposição”. Mas a relação dos esquerdistas com os socialistas, e vice-versa, fica para um próximo artigo.

5 comentários:

Anónimo disse...

A qual das famílias esquerdistas pertence o BE?

Anónimo disse...

Esta noção de sucesso deixa-me insatisfeito. Não resulta do facto de ser militante comunista, conservador na classificação do autor (apesar de negar qualquer conservadorismo em quem pretende que a evolução humana se construa numa base revolucionária). Mas qual a medida utilizada? Os resultados eleitorais? E estes são medidos a partir de que meta ou objectivo? E qual o sucesso ou insucesso de cada partido de acordo com a sua base programática? E qual o sucesso ou insucesso dos partidos pelo facto de tomarem ou não partido?
Gostaria ainda, apresentar o meu desacordo relativamente ao agrupamento entre os partidos, feito de uma forma que me parece simplista e que não consegue desligar-se di facto de pertencerem ou não ao P. da Esquerda Europeia. Mesmo na classificação, no sucesso e insucesso ignora-se o papel dos partidos na unidade ou desunião entre diferentes partidos na base de um programa de acção. Por exemplo a constituição do GUE/NGL e o drama que foi a ausência de um grupo parlamentar com voz e influência no PE no inicio dos anos 90 e o que entretanto se conseguiu construir e muitos, alguns dos que são caracterizados com sucesso muito têm feito para destruir.

Ricardo

j.e.simões disse...

Uma nota: a posição radicalmente diferente de gupos marxistas-leninistas face ao "legado soviético": a contestação trotskista ao "estado operario burocraticamente degenerado", desde a morte de Lenine; o corte maoista com o (por ele considerado) "revisionismo social-fascista", desde o XX Congresso do PCUS; o reformismo dos PC's tradicionais num contexto democrático-burguês, na actualidade.
Creio que uma tão vasta gama de opções não aconselharia a adopção do "legado soviético" oomo seu critério definidor (muito menos em termo de valoração acrítica ou pouco crítica).

Anónimo disse...

Existem o caso curioso em Portugal dos Verdes, que se coligam com o PCP, apesar de não parecerem de modo algum "comunistas consevadores", como se verá esta partido nesta distribuição?

Anónimo disse...

E qual é a família do PS,D ?