segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O PIB é uma medida da riqueza, mas o que é a riqueza?


Como quase sempre acontece, para responder temos de olhar para trás - para a história das ideias - e só depois para o presente.
Para Adam Smith a riqueza era “o conjunto dos bens necessários à vida e ao conforto produzidos pelo trabalho”. Mas hoje em dia a maior parte dos economistas tenderá, segundo me parece, a discordar do “necessários” e do “trabalho”. O economista típico dirá primeiro, “o que é necessário e desnecessário é subjectivo, depende de um juízo de valor, e a Economia não faz juízos de valor” e proporá uma primeira modificação à definição de Smith: “o conjunto dos bens desejados pelos consumidores...”. [Ele acha que a necessidade é subjectiva e depedente de valores; já a desejabilidade, sendo igualmente subjectiva, objectivar-se-ia no momento em que o consumidor abre a carteira e paga sem que ninguém discuta os seus gostos].
Dirá depois, “nem só o trabalho cria riqueza” para logo propor como definição definitiva qualquer coisa como: “o conjunto dos bens desejados pelos consumidores e produzidos pelos factores produtivos (terra, trabalho e capital)”. [Como se sabe uma das tarefas da economia neoclássica foi exactamente atribuir ao capital virtudes produtivas].
Será que o assunto fica arrumado? Parece-me que não. Sem discutir agora as virtudes produtivas da terra e do capital (as do trabalho ninguém nega) preocupo-me apenas com um problema da definição de Smith, (a), e outros dois da definição “actual”, (b) e (c).
(a) Não haverá “riqueza” que não é produto do trabalho humano? Florestas, rios, mares, habitats, vida...?
(b) Não existirão bens desejados pelos consumidores que, por existirem à custa de outros bens (por exemplo: florestas, rios, mares, habitats, vida...), representam mais “pobreza” do que riqueza?
(c) Se a resposta a (b) for positiva, não estarão os desejos tão sujeitos a juízos de valor como as necessidades? [o que é mais importante, o desejo satisfeito ou os outros bens sacrificados? Que “peso” devo atribuir a cada um deles nas minhas escolhas?]
Estas são questões “metafísicas”, dir-me-ão. Serão. Mas é com elas e com outras semelhantes que os economistas que actualmente estão envolvidos na reflexão acerca do Produto Interno Bruto (o famoso PIB) são obrigados a debater-se.

7 comentários:

Anónimo disse...

pois , complexificaram tanto a vida depois do Adam que é uma canseira viver. acho que prefiro a solidariedade mecánica ( mesmo com o controle) à orgánica (muita dependência dos outros desconhecidos e uma luta pela vida nada natural).

Anónimo disse...

Um belo texto!

JOSÉ LUIZ FERREIRA disse...

Se o PIB fosse uma medida perfeita da riqueza, e tendo o PIB planetário duplicado na última década, decorreria daqui que os habitantes da Terra deviam, em média, estar agora a ganhar o dobro ou a trabalhar metade do que há dez anos.

Não sendo o PIB uma medida perfeita, esta decorrência não se verifica; mas é uma medida útil para sabermos que devíamos estar a ganhar mais ou a trabalhar menos.

Então porque é que não estamos?

Miguel Rocha disse...

Concordo totalmente com o texto.

Penso que a utilização do PIB como medida de riqueza é um pouco anacrónica tendo em conta que a maior parte das pessoas, actualmente, valoriza, não apenas o dinheiro que tem no bolso, mas o ambiente que as rodeiam.

Qual o país mais rico? Um país com um PIB per capita de 100 unidades monetárias mas com os seus capital natural muito delapidado ou um país com PIB pc de 50 u.m. e o seu capital natural sustentado e sustentável no tempo?

Para além disso, a despesa em armamento que os cidadãos norte-americanos fazem entra para o PIB. Será que esse facto pode ser considerado um indicador de desenvolvimento?

O índice de desenvolvimento humano é um indicador compósito que vem remar contra a maré mas está muito longe de destronar o PIB como medida consensual de riqueza, que a meu ver, tem de ser uma medida de desenvolvimento.

Cumprimentos

Anónimo disse...

A riqueza? é a minha vizinha do rés-do-chão!

Anónimo disse...

ora , estou segura que os anos que vêm para aí vão ser bem melhores que estas últimas 3/4 décadas porque pessoas como o senhor e o Oneto e o Serras Pereira vão ser capazes de conseguir que a vossa voz seja ouvida.
não gosto nadinha do anão medroso homo economicus : tão básico que tira a pica toda.
Bem hajam!

Anónimo disse...

Era o que faltava criticar uma coisa por aquilo que ela não é.. o PIB mede a riqueza económica, o valor acrescentado do ponto de vista económico e ponto final... é tudo isso que ele é, e tudo o que ele é acaba aí... é como se anda-se a criticar um termómetro por não medir a humidade.. não mede nem nunca tentou medir.. qual é o problema?

Estas tentativas mesquinhas de criticar o "economicismo" do ponto de vista de um humanismo foleiro, é totalmente escusada.