segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Um economista de combate no Prós e Contras

O José Guilherme Gusmão vai estar hoje no Prós e Contras a debater o orçamento. A não perder. Entretanto, fiquem com um excerto de um artigo recente: "Um dos debates em torno do próximo orçamento será o debate do Investimento Público. É virtuoso? É oportuno? É grande ou pequeno? Sobre esta matéria, o PS tem procurado desenhar uma marcada fronteira ideológica com a Direita. Usando bons argumentos, defendeu a importância do Investimento Público na dinamização da economia, na criação de emprego e na busca de soluções para os bloqueios ao desenvolvimento da nossa economia e sociedade. Até que ponto as políticas do PS concretizam o sentido desta pedagogia é, claro está, outro assunto."

11 comentários:

JOSÉ LUIZ FERREIRA disse...

É bom saber que outros economistas que não os do regime começam a ter acesso à comunicação social. Não vou perder o programa.

Bruno Silva disse...

Gostaria de uma resposta efectiva a estas questões:

1) Concordam que, a ser realizado, o investimento público como "tratamento de choque" não poderia gerar um desmesurado aumento de contratados públicos sem termo, certo? Teria de ser pela via do que vocês chamam de trabalho precário não é assim?

2) A dinamização do consumo interno sem resolver o défice estrutural da balança comercial terá um impacto elevado nas importações o que, apesar de aumentar o nível de "bem estar" no curto prazo, agravará o endividamento do país certo?

3) O consumo de financiamento, mão-de-obra e impostos por parte do estado, apesar de putativamente (porque não passa de mera especulação) poder ter efeitos reprodutivos no futuro, a curto prazo terá um efeito negativo na recuperação do investimento privado, certo?

josecaldas@ces.uc.pt disse...
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José M. Castro Caldas disse...

Caro Bruno Silva,
Vale a pena responder porque me parece que há mal-entendidos genuínos:
1) Investimento público… “contratados públicos”? A pergunta sugere que o Bruno pensa que o estado quando investe, em estradas por exemplo, contrata trabalhadores para as construir. Não é assim: o estado contrata empresas que têm trabalhadores (a termo certo ou incerto) que podem estar em risco de ser despedidos.
2) Nem tudo o que consumimos é importado. Muito longe disso. As empresas portuguesas, além de poderem exportar, também vendem aos consumidores portugueses. Além disso o endividamento externo não resulta apenas do défice comercial. Mesmo com excedente comercial um país poderia endividar-se. Imagine, por exemplo, que o excedente comercial era investido no exterior. Há consumo e também há investimento, em parte financiado no exterior.
3) Investimento público a impedir investimento privado? Nas condições actuais? Não. Falta investimento privado e isso não acontece porque os juros são altos, mas antes porque as expectativas a respeito da procura são negativas.
4) Em comentário a um post anterior o Bruno dizia (com mais certezas e menos dúvidas) que nós falávamos aqui de “homem novo”. Não me lembro de alguma vez isso ter acontecido. Pela minha parte o único “homem novo” que conheço é o executivo e o especulador financeiro para quem o único critério que interessa para distinguir entre o que está certo e o que está errado é o benefício financeiro. Conheço também homens e mulheres que acham que não é impossível tornarem-se pessoas melhores e que não é impossível melhorar a sociedade.

Bruno Silva disse...

Obrigado pelas respostas.

Deixo os meus comentários:

1)Ok, desse ponto de vista tem razão, mas desilude-me. Partindo do conceito de "custo de oportunidade", vejo que é mais um que quer continuar com a política do betão que Portugal vive nos últimos 30 anos. Pensava que só os membros do governo, influenciados pelos lobbies da construção, é que queriam continuar com isso. Há muito mais investimento público que se pode fazer, no capital humano sobretudo!

2)O consumo divide-se numa componente interna e numa externa, que existe e que já não é compensada por exportações quanto mais se ainda for incrementada. Quanto à segunda via, o endividamento, essa já vai ser agravada o suficiente pelo governo (é essa que vai, em primeira mão, suportar o aumento artificial do consumo pela via do investimento, não se esqueça)

3)Baixar impostos não gera procura generalizada? Baixar impostos não aumenta o VAL dos investimentos que as empresas têm na gaveta? Se o estado baixar impostos o dinheiro fica-me no bolso, agora se for para a Mota-Engil tem que dar pai 30 voltas e mesmo assim não sei se cá chega...

4)Pois, eu também conheço muita gente que se tornaria melhor, mas enquanto continuar a "chover" no bolso por via da seg. social, ou enquanto estiverem protegidos por uma lei laboral que lhes permite reger pelo esforço mínimo sem poderem ser despedidos por justa causa, vão continuar a ser pessoas medíocres. Sabe bem que não foi a especulação que causou a crise, não é que eu a esteja a defender, mas um especulador elimina-se com leis, um parasita gera-se com leis.. e nesta altura há mais parasitas do que especuladores.. qual deles o pior...

José M. Castro Caldas disse...

Bruno,
Só lhe queria lembrar a respeito de 3), porque estas coisas esquecem-se muito, que nada há mais errado do que pensar que se não pagarmos impostos o nosso dinheiro fica no bolso. Se não pagarmos impostos não há serviços públicos, em última análise não há estado. Tem de ir ao médico, paga, tem de ir à escola, paga, quer viajar não tem estradas nem caminhos, ou então paga portagem em todo o lado, quer por um pé no chão e é tudo um lamaçal, ou compra bilhete para ir à rua. Além disso é natural que fique sem carteira, porque também não há polícias. Ou será que na sociedade sem estado não há ladrões?
Isto só não é verdade para mim ou para si se eu (ou o Bruno) não pagar impostos, mas os outros continuarem a paga-los.
Relativamente a 4) não me diga que acredita que não é possível despedir com justa causa? Até sem justa causa, quanto mais com ela. Além disso ser despedido é uma coisa que muito facilmente pode acontecer a qualquer um de nós. Especialmente em caso de depressões económicas. Espero que nunca lhe aconteça a si.

Bruno Silva disse...

3) Um mínimo de seriedade por favor. Acho que aqui ninguém precisa de lições sobre o uso basilar do dinheiro público. A questão prende-se com 1) A eficiência com que é usado e 2) a utilidade com que é gasto. Aqui é que reside a discussão e está a fugir-lhe na direcção de um sermão para crianças. Portugal não tem claramente um défice de infra-estruturas. Não é aí a fonte da nossa baixa produtividade, mas os socialistas continuam a achar que é.

4) Claro que as empresas podem despedir quando querem, mau era se assim não fosse. Agora, concordando que paguem uma indemnização, acho que para o esforço constante que lhes é exigido ao nível de TSU, as indemnizações são extremamente elevadas, levando uma empresa que esteja num ponto muito crítico e necessite de reduzir o pessoal para voltar a ser competitiva, a ir a falência porque nem consegue manter o pessoal que tem, nem tem fundos para pagar as indemnizações que necessitaria e ainda continuar saudável (atenção que eu não estou a falar de grandes multinacionais, este cenário é uma realidade ao nível das PME's). Imagine uma confecção de 50 pessoas que tem de despedir 20 funcionários com 15 anos de casa, dá um balúrdio. Se não pagassem tanta TSU, até compreendia, mas assim não.

Se nem os países com elevada competitividade conseguem manter, em simultâneo, elevada protecção do desemprego e elevada protecção no emprego, o que nos leva a nós pensar que podemos??

Para além disso, douto que é em economia perceberá que, rigidez no despedimento gera rigidez na contratação. Assim como, rigidez na negociação para baixo dos salários e alturas difíceis, gera também, rigidez na subida, pois incrementa os riscos. Não estou a defender um cenário extremo, mas algo pelo menos mais moderado.

José M. Castro Caldas disse...

Vamos lá a ver isso da seriedade... Pensei que tinha escrito que as empresas não podiam despedir nem com justa causa (e vendo bem escreveu mesmo). Já agora quando despedem com justa causa não têm de pagar indemnização nenhuma. As empresas têm muitos custos e é difícil gerir uma empresa. Eu sei. Mas porquê não falar dos custos das matérias-primas, dos custos dos produtos intermédios e falar apenas dos custos salariais directos e indirectos? A mim parece-me que é para empurrar os custos da empresa para a parte mais fraca (os trabalhadores descartaveis). Pensei também que tinha escrito que “se o estado baixar impostos o dinheiro fica-me no bolso” (e vendo bem escreveu mesmo). Não era o que queria escrever? Não sabia. "Ninguém precisa de lições”. Olhe eu preciso. Desculpe se lhe pareço de novo demasiado "douto" mas parece-me que a ideia de que existe uma relação virtuosa entre “flexibilidade” e emprego já não convence mesmo muitos dos que a defenderam no passado: a evidência empírica é contraditória e as lições da crise duras. Quanto ao resto... eficiência e utilidade nos gastos e investimento público. Claro, como poderia ser de outra maneira?

Bruno Silva disse...

O que eu disse foi o seguinte: "reger pelo esforço mínimo sem poderem ser despedidos por justa causa" o que é verdade. Ou seja, um trabalhador que esteja no limiar da diligência devida ao desempenho das suas funções, ou seja, que se reja pelo esforço mínimo (medíocre), mas ainda assim dentro dos parâmetros mínimos, tem exactamente os mesmos "direitos" do que um trabalhador que sua a camisola. A meu entender não os merece.
A questão é muito simples, é que matérias-primas a empresa compra mais ou menos, consoante as encomendas, agora, o trabalhador é contratado para trabalhar, e se já não há trabalho para a totalidade de funcionários da empresa, nem perspectivas optimistas de curto prazo, vai fazer o quê? pôr umas mesas para as pessoas jogarem dominó? lavarem janelas com cotonetes para se entreterem? Como é óbvio exige-se às empresas uma atitude solidária, mas há limites, se não há trabalho, isto é pôr as empresas a pagarem subsídios de desemprego encapotados, e essa é a função da Segurança Social (a qual é altamente financiada por essas mesmas empresas). Este caminho, faz com empresas que até estejam com a capacidade instalada adequada, no caso de se depararem encomendas que obriguem à contratação de mais pessoal para dois ou três anos, tenham de adoptar uma atitude muito mais conservadora, e deixem algumas encomendas escaparem para outros países. Ou seja, não contratam no presente porque estão assumir elevados compromissos para um futuro incerto. E o trabalho esvaísse… a oportunidade de PRODUZIR esvaísse.. mas ao menos não irão despedir no futuro!

Quanto ao dinheiro no meu bolso, acho que facilmente se percebe que queria dizer que o dinheiro gasto em obras públicas de benefício duvidoso, não chega tão eficientemente ao bolso da população em geral como a redução de impostos, e consequentemente ao estímulo ao consumo. Aliás, a actual crise nasceu de um crescimento assente no crédito para construções não produtivas (casas e prédios), o que vocês estão a propor é um novo crescimento assente em mais crédito para estruturas que, face ao que já existe, o retorno marginal é ele também muito dúbio, pergunto, não aprenderam nada com a actual crise? Eu sei que o endividamento tem um efeito duplo, mas já não estamos endividados que chegue? Sabe quais são os instrumentos económicos que ainda nos restam? As mãozinhas para trabalhar, a cabeça para pensar, e as máquinas para produzir, along the way, os economistas esqueceram-se que estes são os principais instrumentos! (tanto à esquerda como à direita). Mas sobretudo a esquerda, cultiva a ideia que o país vai lá com leis ou políticas, o papel do “indivíduo” é praticamente irrelevante, a liberdade e consequente responsabilização do mesmo são fait divers. Só o patronato e o grande capital é que têm responsabilidades, não consegue ver que é essa atitude que contribui mais para desvalorizar o próprio indivíduo comum? Eu sinto-me uma pessoa mais valorizada quando me atribuem deveres e responsabilidades, não quando me atribuem direitos no papel, isso até me diminui a auto-estima, eu orgulho-me das minhas conquistas não coercivas sobre terceiros, não as coercivas, eu quero que quem me paga o ordenado pague porque quer, não porque é obrigado. O conjunto de pequenas acções de irresponsabilidade individual levam a efeitos mais perversos do que as pontuais irresponsabilidades do “peixe graúdo”. Os alunos que se baldam durante anos e em cursos lotados ou já desnecessários, o consumismo desenfreado, o parasitismo, a apatia profissional, o endividamento irresponsável, o sofá em vez da formação contínua, etc.. estes actos individualmente irrelevantes, agregados, são as principais causas da crise estrutural, mas não há ninguém que chame a atenção a isso, porque certas pessoas continuam com o discurso de que “ah e tal a culpa é os patrões e da grande finança”, e as pessoas comodamente aceitam essa desculpa. Mas não se esqueçam, quando apontamos 1 dedo a alguém, 3 dos nossos dedos apontam para nós!

José M. Castro Caldas disse...

Tem razão no ponto do despedido sem justa causa … e esforço mínimo e o argumento dos custos fixos e variáveis faz sentido.
Mas transformar os trabalhadores em custo variável já não é uma boa ideia. Repare que já se foi muito longe nesse via e nem por isso o desemprego diminuiu e as economias se tornaram mais robustas. E nem por isso as economias mais flexíveis são aquelas onde existe menos desemprego. Já temos lay-offs, horários flexíveis, despedimentos por extinção do posto de trabalho, além do despedimento colectivo claro. Quanta mais flexibilidade é necessária? Contratar ao dia? Parece-me que também não é isso que deseja. Não é só uma questão de decência. O problema é que o que é bom para uma empresa particular – poder despedir (ou baixar salários) para sobreviver ou para aumentar o lucro e a valorização bolsista – pode ser desastroso para todas. Não nos esqueçamos que os trabalhadores (nós) também são consumidores e clientes. Na onda da flexibilização o que resultou foi uma extraordinária regressão na repartição do rendimento. Tão extraordinária que a procura só pôde ser sustentada … emprestando a crédito ( a quem dificilmente poderia pagar) os recursos financeiros acumulados.
Por fim, não assuma que “nós” temos as opiniões que pensa que temos. Crédito em fartura para consumo desmedido, obras inúteis, desperdício público? Nunca me apanhei a defender semelhantes aberrações embora já tenha dito muitas asneiras na vida.
Quanto à responsabilidade individual, quando é confundida com “cada um por si”, de facto não me encanta. A conversa já vai longa e eu (sem querer ser indelicado) não poderei continua-la indefinidamente. Mas isto também não é um concurso para ver quem fica com a última palavra.

José M. Sousa disse...

«Na onda da flexibilização o que resultou foi uma extraordinária regressão na repartição do rendimento. Tão extraordinária que a procura só pôde ser sustentada … emprestando a crédito ( a quem dificilmente poderia pagar) os recursos financeiros acumulados.»

Neste contexto, The Credit Crunch
The Credit Crunch Housing Bubbles, Globalisation and the Worldwide Economic Crisis
é um bom livro para aprofundar o tema.