quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Voando sobre um ninho de cucos


Ler o relatório sobre a descida da TSU e o aumento do IVA é toda uma experiência que varia entre a pior teoria económica neoclássica, o enviesamento ideológico e um optimismo infundado. E, ainda assim, só um governo cego insistiria na descida da TSU depois de ler as conclusões do estudo.

Vamos por partes. O relatório procede a um conjunto de simulações macroeconómicas em torno da descida da TSU e correspondente aumento da taxa de IVA, por forma a torná-la orçamentalmente neutra. Para isso utilizam um modelo de equilíbrio geral que, basicamente, ignora todo o contexto económico real: não há austeridade orçamental interna, não há volatilidade nos mercados financeiros, não há riscos de recessão mundial. Enfim, os modelos desautorizados pelo anterior governador do Banco de Portugal, como o João abaixo assinala. Mais, um dos pressupostos do modelo é o da optimização intertemporal dos consumidores que, de forma simples e simplista, implica que os portugueses tomam as suas decisões de consumo com vistas indefinidamente largas no tempo e tendo perfeito acesso ao crédito (uma hipótese completamente desacreditada pela própria economia neoclássica com os contributos da economia comportamental). Todavia, o mais fantástico é a própria confissão dos autores de que o modelo procede a hipóteses demasiado simplificadoras e que há constrangimentos, como o racionamento do crédito externo, impeditivas de qualquer veracidade dos seus pressupostos. Resumindo, o meu modelo não vale um chavelho, mas uso-o na mesma.

Por outro lado, os autores assumem a sua fé inquestionável nos mercados concorrenciais eficientes: a falta de competitividade da economia portuguesa está toda na regulação do mercado de trabalho, na regulação no mercado de produto e na política industrial que promove alguns sectores. Esqueçam toda a produção intelectual e académica sobre integração europeia, união monetária, liberalização do comércio mundial, captura do Estado por determinados grupos. Isso só complica o receituário de sempre. E já me esquecia: para os autores basta estar num sector exposto à concorrência internacional, de bens transaccionáveis, para a redução da TSU se reflectir imediatamente nos preços dos produtos. O idealizado mercado impedirá que os patrões se sirvam da medida para aumentarem as suas margens.

Concluindo, os autores usam modelos em que nem eles próprios acreditam, estão completamente cegos pelo seu fundamentalismo de mercado e, surpresa, surpresa, nem assim se mostram muito convencidos com a eficácia da medida, dados os seus efeitos recessivos de curto prazo e as distorções que podem introduzir entre os diferentes sectores da economia. Importa ainda notar que o estudo não diz nada sobre quanto é que nosso défice externo seria reduzido. Avançar com esta medida coloca em causa qualquer lógica.

5 comentários:

Diogo disse...

«Avançar com esta medida coloca em causa qualquer lógica»

O que só prova que estas medidas nada têm a ver com o interesse do país. Mas há seguramente alguém a quem elas beneficiam…

Os cucos não têm ninhos disse...

Logo não se pode voar sobre eles

O cuco por natureza tal como o especulador faz nos ninhos alheios
a sua postura de crises futuras

Anónimo disse...

Diogo, a banca paga TSU e não paga IVA.

Anónimo disse...

Mas afinal quem são os "crâneos" que fizeram o relatório.?
Será que este é mais um daqueles relatórios que são encomendados( e pagos a bom preço) aos chamados "técnicos" e "grandes" economistas da nossa praça em que as conclusões estão pré-determinadas.?
Independentemente de tudo o mais, este é mais um dos grandes roubos aos cidadãos deste país desta feita encomendado pela mafia estrangeira e levado a cabo pela nacional.
Acorda Zé Povinho.

Um Jeito Manso disse...

Estava agora a dar uma vista de olhos aos blogues que costumo ver e gostei de ler este seu post.

Justamente, acabei de escrever sobre este tema da TSU. Se quiser dar uma vista de olhos:

http://umjeitomanso.blogspot.com/2011/08/baixar-tsu-agora-nao-nao-e-nao-alguem.html

Cumprimentos.