terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Precisamos de um plano de contingência



Aproxima-se mais uma cimeira da UE e crescem os apelos para que sejam tomadas medidas que, definitivamente, salvem a zona euro. Tudo indica que as propostas da Alemanha serão aprovadas. Teremos um visto prévio dos orçamentos nacionais e imposição de “reformas estruturais”. Serão punidos os países que, apesar da vigilância ex-ante, tenham défices excessivos. E a Alemanha fechará os olhos a intervenções do BCE em larga escala.

Fica resolvida a crise? Não.

Passadas algumas horas, as agências de notação vão “descobrir” que as perspectivas de crescimento da maioria dos países da zona euro são más. O que não admira porque o que se pretende é que a austeridade seja a política económica da zona euro. Seguir-se-á a baixa da notação de vários países e do próprio FEEF. As taxas de juro continuarão insustentáveis, porventura ainda mais, e a incerteza no sistema bancário agudizar-se-á. As intervenções do BCE, embora a uma nova escala, continuarão a ser um paliativo porque a raiz do problema está na esfera real da economia.

A ideologia que domina Bruxelas, Berlim, Frankfurt e várias outras capitais europeias impede o reconhecimento de que o problema de fundo é a dívida privada da periferia. É a impossibilidade de, numa zona monetária que não é (e não pode ser) um estado federal, aberta ao livre comércio e à livre circulação de capitais especulativos, poderem coexistir países com nível de desenvolvimento económico desigual. Mesmo a Itália e a França têm dificuldade em permanecer na moeda única. Negando este problema de fundo, a Alemanha e seus acólitos apenas prolongam a agonia financeira, económica e social dos países mais frágeis.

Um qualquer incidente acabará por desencadear uma sequência de acontecimentos incontrolável e fatal. Evidentemente, precisamos de um plano de contingência mas duvido que o nosso governo sequer perceba o que está em causa. Aliás, mesmo sem euro fará questão de aplicar com mais afinco a austeridade. Tanto pior para nós.

4 comentários:

João Carlos Graça disse...

"União Europeia":
"We are the hollow men/ We are the stuffed men/ Leaning together/ Headpiece filled with straw. Alas!/ Our dried voices, when/ We whisper together/ Are quiet and meaningless/ As wind in dry grass/ Or rats' feet over broken glass/ In our dry cellar/ Shape without form, shade without colour,/ Paralysed force, gesture without motion;/ Those who have crossed/ With direct eyes, to death's other Kingdom/ Remember us - if at all - not as lost/ Violent souls, but only/ As the hollow men/ The stuffed men..."

Anónimo disse...

"...precisamos de um plano de contingência mas duvido que o nosso governo sequer perceba o que está em causa."

Concordo inequivocamente com esta sua afirmação, a sensação de desamparo é tremenda perante tão dura realidade.

Nuno disse...

Gostava muito de ver um debate sobre este eventual "plano de contingência" no Porto (para variar).

Dada a nossa dívida privada e a possibilidade de alguns cenários inéditos a primeira questão que as pessoas se colocam é o que sucede aos seus empréstimos e hipotecas, actualmente denominados em Euros e como é possível criar um segundo euro, ter duas moedas ou reverter para o escudo de forma ordenada sem sofrer uma fuga de capitais a uma escala maciça.

Dias disse...

Teremos um visto prévio dos orçamentos nacionais e imposição de “reformas estruturais”.


No campo das hipóteses, um cheirinho do cenário aqui bem traçado pelo J. Bateira:
“Aumento da idade das reformas: JA, corte de salários: JA, aumento do horário de trabalho: JA, aumento de taxas moderadoras: JA, compra de mais submarinos alemães: JA, contrato com a Siemens (TGV): JA, actualização de salários: NEIN, dinamização dos estaleiros de Viana: NEIN, aumento das quotas leiteiras: NEIN, financiamento à criação de lares da terceira idade no Allgarve: JA, financiamento à investigação: NEIN”.

Pelos vistos, trata-se de uma imposição da Alemanha, sobre a qual nenhum português tem sequer o direito de se pronunciar. Não sei qual será a reacção da Inglaterra, Holanda ou Suécia, mas é provável que os seus governos queiram outra cartilha, não a da vassalagem a Merkel e muleta. A democracia nem chega a acabar com a discricionariedade, é simplesmente abolida: nem consulta, nem voto.

Haverá portugueses onde a rebelião estará latente, outros “colonizáveis” aceitarão que seja a Alemanha a mandar nas suas vidas. Mesmo naqueles casos de passiva indiferença, e sem qualquer ponta de ironia, haverá uma questão imediata que se deve pôr na cabeça de cada um: mas, afinal, será justificável a existência de um parlamento nacional?
E indo mais longe, para que servirão a Comissão Europeia e o PE, mais o Rompuy e o Barroso? Para o folclore europeu?