domingo, 5 de maio de 2013

Democracia sem fim?


Já se notou que, no seu discurso de sexta-feira ao país, Passos Coelho não falou uma única vez no desemprego. Apesar disso, ou talvez por causa disso, Passos anunciou vários contributos políticos decisivos, que Paulo Portas, com a lata que o caracteriza, diz hoje subscrever à volta de 90%, para que o desemprego seja um assunto cada vez mais falado entre os que por aqui vivem. O desemprego continuará a aumentar, quer por via dos despedimentos maciços anunciados na economia pública, num país onde a percentagem dos trabalhadores do sector público está abaixo da média da OCDE, quer por via de mais e decisivos cortes nos rendimentos e nos serviços públicos. Os efeitos negativos na procura multiplicar-se-ão por toda a economia, dadas as interdependências entre economia dita pública e economia dita privada no capitalismo realmente existente.

A verdade é que o desemprego é essencial para o sucesso do programa político de Passos e Portas. O programa consiste em operar uma maciça transferência, mais aberta ou mais dissimulada, dependendo do artista, de rendimentos e de riqueza do trabalho para certas fracções do capital, nacional e sobretudo estrangeiro, por via da redução do salário directo e indirecto, por via da destruição do estado social e das forças que o podem defender. Economia do medo, como bem denunciou a Cáritas esta semana: “o mundo laboral vive hoje debaixo de um sentimento de medo que condiciona e obriga a aceitar todas as regras e todas as imposições”. Os despedimentos no sector público, a insegurança laboral renovada, são essenciais nesse processo e também na destruição da autonomia e relacionada possibilidade de defesa do interesse público. Reparem também como o aumento do horário de trabalho na função pública envia um sinal poderoso e perverso, contrário a toda a política pública sensata em momentos de crise, como de resto, por exemplo, as tão admiradas elites políticas alemã sabem, mas consistente com toda uma política sistémica: em Portugal, serão cada vez menos a trabalhar cada vez mais, uma tendência já em curso; deveriam ser cada vez mais a trabalhar cada vez menos.

Como Passos também anunciou, esta política prolongar-se-á no futuro. É de inevitável neoliberalização que falamos num regime monetário que bloqueia estruturalmente a soberania, ou seja, uma condição necessária para a democracia. Para esta regressão, Passos conta com apoio externo das instituições do Consenso de Bruxelas e de Frankfurt e com os eventuais efeitos políticos da chantagem do fim do euro, como de resto deixou claro. Ninguém à esquerda pode dar mais para o peditório sobre o desastre que seria o fim do euro. Como afirmou ontem Octávio Teixeira no Público, o que é “catastrófico é manter este caminho, não a saída do euro”. A esta chantagem, o povo terá então, mais cedo ou mais tarde, de responder com um acto de autoprotecção: derrubar o governo, denunciar o memorando e preparar-se para a recuperação da soberania perdida, e dos instrumentos de política económica que são parte da sua infraestrutura, digamos. Só assim se recupera a democracia que foi perdida e se assegura a sua futura expansão.

4 comentários:

Anónimo disse...

Um dos problemas (entre uma infinidade deles...) da saída do euro é que, no estado político a isto chegou, nada garante que essa saída seja conduzida pela esquerda. O processo pode muito bem vir a ser conduzido pela direita. Parecia que quando a crise se declarou em 2008 seriam as políticas neoliberais que ficariam em causa. Foi o contrário, Reforçaram-se. Nas situações que certamente se gerarão com a saída do euro (dificuldades de abastecimento a todos os níveis de um país que não é auto-suficiente em quase nada) poderá estar um 'caldo de cultura' que seja cavalgado por defensores de soluções musculadas tanto política como socialmente. Não são só os aspectos económicos que estão em causa, os políticos poderão ser ainda mais assustadores... E, no entanto, a saída parece ser quase uma questão de sanidade mental. Não há forma de isto poder vir a acabar sequer sofrivelmente

Carlos disse...

Pois, nada garante que a saída do Euro seja conduzida pela esquerda: irá depender do povo português abrir os olhos, e nas próximas eleições não voltar a votar nos mesmos de sempre (PSD+PS+CDS)que nos governam ineterruptamente desde o 25 de Abril de 74! Será necessário dar a oportunidade não só aos outros 2 representados na AR (CDU+BE) como tb aos que ainda não conseguiram entrar na AR (MRPP+POUS+etc). São partidos patrióticos e que têm a enorme vantagem de não estarem dominados pelas teias de corrupção mafiosa que dominam e controlam as máquinas partidárias dos 3 partidos do chamado Arco da Governação, e que há quase 40 anos nos governam. É que a saída do Euro parece-me inevitável a médio/longo prazo. E que o caminho que se segue actualmente terá como consequência que essa saída seja completamente dominada pela direita, lá isso terá...

Anónimo disse...

Isto é o bando dos quatro.!?
Creio que as politicas neoliberais, em Portugal e pela mão do bando dos quatro, estão no auge.
Não podemos, pelo nosso lado, baixar os braços. Temos de lutar contra este bando que esmaga o pais, e a democracia.
E Saida do euro já.!

Anónimo disse...

E,julgamento severo para os terroristas sociopatas sociais!