sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Capitalismo e Corrosão Moral

Hannah Arendt afirmou, em A Condição Humana, que o problema principal da tese que defende a redução das motivações humanas ao egoísmo não reside no facto de ser verdadeira, mas sim no facto de poder tornar-se verdadeira, pondo assim em causa a existência de uma ordem social viável. De facto, nenhum sistema socioeconómico consegue reproduzir-se de forma satisfatória apenas com indivíduos egoístas. Felizmente, e ao contrário do que João Miranda possa pensar, as motivações humanas são complexas e exibem uma tremenda variabilidade e plasticidade. Um dos problemas do desenvolvimento do capitalismo sem freios é precisamente o de gerar ideologias que podem persuadir as pessoas de que o egoísmo racional é o alfa e ómega da vida humana e de criar estruturas e incentivos que dão livre curso não ao interesse próprio (noção vazia porque o que interessa a cada individuo varia e depende em parte da natureza das instituições em que está imerso), mas sim à cupidez mais desbragada, traduzida na busca incessante de dinheiro. Quando isto acontece as próprias fundações do sistema são abaladas. É que, como afirmou Albert Hirschman, o capitalismo precisa muito mais de generosidade, confiança, reciprocidade e até de altruísmo do que os seus ideólogos tendem a reconhecer e do que as estruturas geradas pela expansão, sempre politicamente suportada, do mercado se calhar possibilitam (sobre a corrosão moral gerada pela expansão do mercado ver também o contributo de Fred Hirsch). Não deixa de ser irónico que o capitalismo precise de ser defendido dos seus mais denodados defensores.

1 comentário:

Diogo disse...

O altruísmo é uma parte fundamental do egoísmo. Se assim não fosse, a vida em grupo era impossível. O cooperar, o ajudar, o assistir são funções fundamentais de sociedades gregárias.

Os “Blasfemos” entraram numa espiral extremista e redutora do conceito de egoísmo. Daí, as linhas delirantes com que cosem as suas políticas – necessariamente destinadas ao desastre. Não são puristas, são cegos.