quarta-feira, 11 de junho de 2008

Crise logística

Pode ser que daqui a pouco já tudo tenha terminado, mas até agora a paralisação dos empresários de camionagem serviu para pelo menos duas coisas: (1) Revelar a extraordinária fragilidade do sistema de logística - bastaram dois dias! (2) Relembrar outras paralisações de empresários de transportes, de má memória. Gostei de ver os sindicatos longe deste movimento. Afinal também aqui Polanyi é para levar a sério: o contra-movimento - o movimento contra a utopia do mercado sem limites - existe no plural e é politicamente indeterminado.

11 comentários:

F. Penim Redondo disse...

O fim da paralisação dos camionistas representará apenas o alívio temporário de quem não estava realmente preparado para este esboço de caos. Se o preço dos combutíveis tiver a trajectória prevista dentro de pouco tempo estaremos numa situação tão má, ou pior, do que aquela que estamos a viver.

Os preços muito altos dos combustíveis levarão à falência, ou tornarão inviáveis, muitas actividades económicas e, como tenho dito desde o início da crise, modificará de forma brutal o nosso padrão e estilo de vida.

Como venho dizendo, o que mais me espanta é a aparente inconsciência do governo e demais autoridades públicas. Não anteciparam a gravidade da situação actual e continuam a tratar este problema como se fosse apenas mais uma luta reivindicativa que é necessário gerir.

Neste momento devia estar em curso a nível nacional uma acção de planeamento intensivo e de redimensionamento do sistema público de transporte de passageiros, de reconfiguração do sistema logístico de abastecimento de mercadorias e de reconsideração dos investimentos projectados.

Ao mesmo tempo o governo devia estar a equacionar uma redução brutal de despesas, com eventual eliminação de departamentos do Estado cuja actividade não é essencial, por forma a libertar recursos para cobrir suspensão do imposto sobre combustíveis durante uma fase de transição, com o objectivo de garantir a mobilidade custe o que custar.

Diogo disse...

De acordo. Meia dúzia de piquetes e o país pára.

João Dias disse...

Apesar de ser a favor das manifestações sociais não posso compactuar com actuações coercivas, neste momento já lamento que as forças de segurança não tenham trabalhado em defesa da legalidade.

O que não quer dizer que não existam razões para indignação, um Estado alicerçado ao poder económico e alienado da sua função de gestor do bem público e sem visão de futuro está agora a gerar estas consequências nefastas. Forças políticas e a comunidade científica alertaram para a necessidade de reformulação das políticas energéticas...o preço está a ser pago neste momento. Mas não é só a investimento em novas formas de energia que falhou, também o Estado actuou lesivamente cedendo ao desbarato uma posição mais soberana no sector energético. As universidades não estão a receber incentivos em geral, e não estão em particular a receber incentivos direccionados para estudos que reformulem a nossa política energética. Alguém já reparou que a electricidade não tem sofrido inflação tão significativa quanto os combustíveis, pois é que já existe uma parte significativa da energia produzida pela via eólica. Eu defendo que deveríamos tentar tornar a produção energética eléctrica independente do petróleo (já aconteceu parcialmente) e depois apostar em veículos eléctricos...(ah, dar uso às pernas) A energia das marés também tem potencial, no Japão estudam-se motores magnéticos... Existe muito potencial, e tem de ser o Estado a marcar o ritmo, porque criar novas fontes de energia é uma questão ambiental e sócio-económica, não podemos deixar cair novamente estes sectores fundamentais em vontades alheias ao bem público.

Anónimo disse...

Bem esta luta social foi pura e simplesmente a que mais impacto causou na sociedade na fase pós-PREC. O que não é nada pouca coisa.

A forma como foi decretada, mantida e promovida, no que diz respeito à sua democraticidade e eficácia deveria fazer corar todos os nossos sindicalistas.

Não nos apressemos com comparações fáceis com outrso lock-outs, os movimentos sociais "progressistas" têm muito a apreender com este processo.

No contexto político em que se dá, este protesto é uma enorme desautorização do governo e o mais forte alerta à insustentabilidade do actual momento.

Lembram-se do aviso do relatório da Sedes? Isto é apenas o início... Vamos ter pedalada para aguentar?

http://mundoemguerra.blogspot.com/2008/06/uma-luta-exemplar.html

http://mundoemguerra.blogspot.com/2008/06/sangue-no-asfalto.html

http://mundoemguerra.blogspot.com/2008/06/pedrada.html

MFerrer disse...

Nesta crise dos transportes, quando muitos pediam até medidas contra o normal funcionamento da democracia e a intervenção sobre a Galp, ou a pura e simples renacionalização...
A estratégia conduzida pelo governo, a enorme paciência de que deu mostras, a racionalidade das suas propostas, e sobretudo, o facto de que não teve que recorrer a medidas extremas ou à repressão policial tão amplamente sonhada e pedida por muitos sectores, permitiu uma assinalável, uma enorme vitória que vai constituir um marco na governação com valores e com sensibilidade social.
Foi a vitória da democracia sobre a arruaça.
Tudo ao contrário do desejo dos que, repetidamente, sonharam com escorregadelas repressivas e ou soluções fáceis ao nível da desorçamentação das Contas Públicas e do abandono dos princípios de gestão da coisa pública.
Foi a salvaguarda dos esforços dos portugueses para manterem uma linha de rumo racional.
Finalmente foi gigantesco o contributo que estas actitudes deram para a definição de medidas sociais na Europa e, vejam lá, para o ganho do Sim na Irlanda: É que as imagens da repressão violenta quer em França, quer em Espanha, desgastam a confiança nesta Europa que todos os dias se constroi. Hoje, na Irlanda com o Tratado de Lisboa. Era bom que ganhasse o Sim e o Não fosse derrotado, lá como cá, por KO
Terminaram os sonhos dos que ansiavam ver o PS deitar fora os votos juntamente com cargas policiais!

João Dias disse...

Inacreditável, o Estado falha nas garantias de segurança e provisão dos cidadãos e há quem consiga vislumbrar uma actuação histórica do partido que agora se encontra no poder.
Até por motivos eleitoralistas se justificava a actuação do governo, com garantias de ordem pública (bastante diferente de repressão que materializa agressão gratuita sobre movimentos pacíficos, relembro que no caso concreto existe coerção sobre outrem), alguém acha mesmo que o silêncio do Estado e a sua inoperatividade é um factor positivo para ganhos eleitorais?

E a nacionalização da Galp não devia ser resposta à crise, a Galp nunca devia é ter sido privatizada em primeira instância. Qual é o critério de bem público que justifica a privatização de sectores estratégicos e vitais para sociedade portuguesa??? Pois claro, nenhum.

É preciso lembrar que se as coisas chegaram ao ponto que chegaram deve-se à inoperância do governo, é que os tumultos chegam porque o Estado não actuou no sentido de contrariar a especulação nos combustíveis. Nos EUA as petrolíferas foram chamadas para se explicarem...nos EUA...não foi em nenhum regime "papão" comunista.

O governo ignora movimentos organizados massivos e pacíficos e não actua em salvaguarda da ordem pública...mas há quem só veja eleições à frente.

Anónimo disse...

Uma evidência de que é ainda o Estado quem deve garantir a estabilidade social e a regulação.

Provavelmente poder-se-ia ter evitado a passagem à ilegalidade, ou seja, ao momento a partir do qual este movimento passou a acção intimidatória com os resultados que se conhecem. Menos autismo e maior responsabilidade de todos os actores na procura de soluções, não é favor: é o que se exige.
Exceptuando os habituais aproveitamentos e wishful thinkings, não me parece que qualquer cidadão ansiasse pelo jogo da porrada e da terra queimada.

Anónimo disse...

Caro F. Penim Redondo,

"Ao mesmo tempo o governo devia estar a equacionar uma redução brutal de despesas, com eventual eliminação de departamentos do Estado cuja actividade não é essencial, por forma a libertar recursos para cobrir suspensão do imposto sobre combustíveis durante uma fase de transição, com o objectivo de garantir a mobilidade custe o que custar."

Concordo com a redução de custos, nomeadamente e unicamente os ineficientes. O Estado tem de ser a organização mais eficiente de um país, pois cada euro desperdiçado tem um efeito brutal no seu serviço. (Por exemplo foram gastos 500.000 Eur na cerimónia do 10 de Junho, quantas operações médicas é que não pagava este montante?)

No entanto no resto do seu comentário apontou apenas para a legitimação de um Estado mais liberal e que muito honestamente não julgo que esteja relacionado com a resolução do problema.

Julgo até que a diminuição do ISP e dos impostos apenas atrasará ainda mais a resolução de um problema que tem de ser resolvido. Acabando desta forma por agravá-lo.

Os comportamentos têm de ser mudados e quanto mais cedo melhor (pode ser defeito meu mas estou habituado a antecipar as crises para melhor as contrariar quando elas efectivamente ocorrem).

Portugal é um dos países que mais desperdiça energia, quer electrica quer fóssil e uma redução de impostos apenas premiará esses comportamentos.

Aliás o que esta crise trouxe à tona foram as diversas ineficiências que existem.

O sector de transportes tem demasiados agentes económicos (fazendo fé aos vários comentário) e existem praticas de Dumping, logo tais situações não podem ocorrer. Atribuir subsidios a este sector apenas premeia a sua ineficiência.

O mesmo ocorre com o mercado das lotas, que (outra vez fazendo fé ao comentários) de mercado tem pouco. Uma vez mais atribuir subsidios não resolveu o problema e apenas serve para beneficiar as ineficiências.

Na refinação julgo que acontece o mesmo e ao baixar o imposto apenas se está a atribuir um subsidio indirecto a esse sector.

Julgo que é altura de sermos mais exigentes, não só com o Estado como com as empresas e empresários e com quem tendo capacidade de investir o não faz.

O aumento do petroleo trará muitos problemas, mas a sua resolução poderá ser uma oportunidade formidável para crescermos bem acima do que estamos habituados. A mudança da fonte de energia mudará por completo a nossa sociedade e dado as caracteristicas das alternativas é expectavel que sintamos uma melhoria da qualidade de vida como até ao momento é inimaginável.

Quanto ao Papel do Estado ele não necessitará de ser reduzido (em ultima análise até vejo um reforço do mesmo).

P.S. - Em jeito de nota final, uma redução "drástica" dos custos do Estado levará a mais faléncias do que o aumento do preço do petroleo levará.

Anónimo disse...

"...não me parece que qualquer cidadão ansiasse pelo jogo da porrada e da terra queimada."

Também não me parece, no entanto desconfio que algumas forças politicas estão ansiosas para que isso aconteça.

E diria mesmo que dentro das forças policiais o mesmo aconteça.

Foi impressionante vários episódios que aconteceram e que gostava de ter uma explicação:

- como explicar a passividade das forças policiais perante crimes?

- como explicar a insistencia dos telejornais de que iriam acabar os combustiveis muito antes disso acontecer?

- como explicar que a gaffe do presidente tenha saído misteriosamente do alinhamento do telejornal?

Anónimo disse...

Pois eu penso que foi uma oportunidade desperdiçada!

Quando é que será que se começa a pensar como povos europeus?

Se todos os países que fizeram a paralisação a tivessem feito em comum, gritando conta a UE, outro galo teria cantado e teria havido reuniões de emergência na UE

Era bom que os sindicatos também começassem a rever as suas posições, e então recomeçassem as lutas que fazem sentido com todos os povos da UE a bater o pé à UE.
Caramba! quanto tempo vai demorar a interiorizar que é a UE que tem o Poder?

E a taxa dos juros? Como se pode parar a inflação com os preços a aumentar? Não comendo?

Anónimo disse...

"Era bom que os sindicatos também começassem a rever as suas posições, e então recomeçassem as lutas que fazem sentido com todos os povos da UE a bater o pé à UE."

Embora não concorde em nada com esta manifestação, concordo que seria importante os movimentos se tornassem europeus...