quarta-feira, 27 de julho de 2011

A revolta dos banqueiros



Nos últimos dias assistimos ao impensável: o esboço de um conflito entre o Banco de Portugal e a troika, por um lado, e o clube de banqueiros, por outro, com o governo algures no meio. A linguagem ‘subversiva’ utilizada pelos banqueiros era no mínimo inabitual. O que está a acontecer?

É difícil ler nas entrelinhas do discurso dos banqueiros, mas o artigo de Pedro Guerreiro no Jornal de Negócios ajuda um pouco. O essencial é o seguinte: a) os donos dos bancos não querem participar na sua capitalização – não tanto porque não possam, mas porque hoje em dia há investimentos muito mais atractivos do que a banca; b) os donos dos bancos não querem que o estado participe na capitalização com os meios postos à disposição pela troika, (mesmo que temporariamente), tornando-se accionista; c) os donos dos bancos receiam auditorias ao crédito concedido que possam expor as suas fragilidades e tornar inevitável a participação pública.

Os grupos financeiros portugueses sempre foram incapazes de resistir pelos próprios meios a ofensivas externas e sobreviveram como entidades relativamente autónomas apenas sob a protecção do Estado português. Neste momento, com o Banco de Portugal transformado em agência do BCE e o ministério das finanças em comissão executiva da troika, podemos estar a viver o momento em que o Estado português deixou de ter capacidade para desempenhar esse papel. Nestas circunstâncias a participação temporária de dinheiro público (obtido com o financiamento da troika) na capitalização dos bancos portugueses pode ser a antecâmara da transferência da propriedade dos bancos portugueses para grupos financeiros de dimensão europeia. É isto que os donos da banca portuguesa receiam e podem ter boas razões para recear.

Não deixa de ser verdade que neste momento quem manda é a banca, mas a banca que manda já não é a portuguesa. Os “donos de Portugal” estão a perder o pé contra donos de coisas maiores.

Devemos aliar-nos num fervor patriótico aos nossos donos menores na sua luta contra os donos maiores e os seus infiltrados? Não me parece. É importante que a banca em Portugal tenha margem de autonomia relativamente a estratégias que nos são alheias, mas talvez estejamos a chegar ao ponto em que isso só poderia ser garantido com a nacionalização dos bancos. Bem sei que isso fere a sensibilidade de donos menores e de donos maiores e, de tão radical que parece ser, a de muitas outras pessoas. A mim parece-me simplesmente que é verdade.

4 comentários:

Ocemecê é tio d'algum gestor? disse...

só poderia ser garantido com a nacionalização dos bancos. Bem sei que isso fere a sensibilidade de donos menores...nã nã fere

só que tal como dantes não vai dar grande resultado

a não ser pró pessoal que vai continuar a fazer aldrabices
seriam neo's BPN's ou assi umas caixas económicas faialenses nacionais?

e há sempre uns tios a meterem a sobrinhada na banca nacionalizada

Anónimo disse...

Então mas todos apontam a nacionalização e socialização dos prejuizos do BPN como um erro de palmatoria e agora prescreve-se o mesmo remedio aos outros bancos todos? Não me parece fazer muito sentido?

Tomás Guevara disse...

"...mas talvez estejamos a chegar ao ponto em que isso só poderia ser garantido com a nacionalização dos bancos..."
Bravo e parabéns pelo comentário
E por esta lúcida conclusão...

Quanto à pretensa "nacionalização do BPN"...já se esqueceu o anónimo de outro esquecimento aquando da nacionalização do BPN,o da nacionalização da sociedade lusa de negócios? Onde repousavam os activos mais relevantes dos accionistas do BPN,alguns dos quais directamente responsáveis pela gestão fraudulenta do BPN?

A nacionalização da banca e a sua colocação ao serviço da economia nacional e ao serviço das pessoas torna-se não só um imperativo económico como também ético e moral.
Com a devida responsabilização dos seus gestores.É que muitos dos gestores das empresas que foram privatizadas foram para lá para apressar a sua ruína e para fazer baixar o preço antes da privatização.
Por isso é que há quem se arrepie só de ouvir falar na nacionalização da banca.As oportunidades de negócio iriam por água abaixo e os sobrinhos dos banqueiros poderiam ver os seus porches em risco
(Já para não falar que o escândalo do BPN ocorreu num banco...privado e não nacionalizado.O que parece relevar alguma ignorância ou má fé do ocemecê)

antónio m p disse...

Na "mouche", José Castro Caldas (e Tomás Guevara). Que isso pressuponha outra composição do poder político é o mais fácil de resolver e o mais inevitável a curto prazo. Que vá contra ventos e marés sem nome (!), faz parte de todos os processos que contam para a História.