sexta-feira, 27 de julho de 2012

OCDE: nem cooperação, nem desenvolvimento

É sabido que Portugal é um dos países mais desiguais da Europa. É sabido que a desigualdade económica excessiva está associada a inúmeros problemas sociais e a crises económicas. É sabido que o aumento das desigualdades salariais, sobretudo com o crescimento dos salários no topo, tem sido um dos factores a impulsionar o aumento das desigualdades um pouco por todo o lado. É sabido que, em Portugal, o sector público exibe menores desigualdades salariais do que o sector privado devido à estrutura das carreiras, à maior presença sindical e à cultura de negociação colectiva. É sabido que comprimir as desigualdades salariais antes de impostos, através da negociação colectiva mais centralizada, por exemplo, sempre foi uma das armas dos países mais igualitários e prósperos mais a norte, onde aliás a percentagem de funcionários públicos é muito superior à nossa. É sabido que assim o trabalho distributivo por via fiscal e dos serviços públicos universais fica mais fácil, criando-se um virtuoso “multiplicador da igualdade”.

Se tudo isto é sabido, então por que é a OCDE quer aumentar ainda mais as desigualdades em Portugal, pondo o sector público a imitar o sector privado, com subidas nos salários lá mais para o topo no primeiro, em nome de “qualificações” supostamente reconhecidas no segundo, comprimindo igualmente os salários lá mais para a base do sector público? Como se fossem as qualificações e não as relações de poder institucionalizadas a determinar os salários, como se o polarizado sector privado devesse servir de referência para o que quer que seja, como se fosse óbvia e natural a tradução das qualificações em salários. E se fizéssemos ao contrário? E se reduzíssemos as desigualdades no sector privado com o reforço da negociação colectiva fora da empresa, com um sistema fiscal mais progressivo, que efectivamente criasse um tecto salarial, ao mesmo tempo que o salário mínimo continuaria a recuperar poder de compra, por exemplo?

De resto a lata da OCDE não tem fim, visto que foi uma das organizações com maiores responsabilidades na difusão da nova gestão pública que erodiu uma cultura de serviço público e desestruturou a consistência do aparelho estatal e agora está preocupada que este não consiga levar a cabo o trabalho de neoliberalização requerido por falta de pessoal qualificado atraído pelos salários do privado. Enfim, a injustiça social é o ADN de organizações neoliberais como a OCDE, durante décadas ao serviço de uma agenda de “reformas estruturais” geradora de todas as fracturas e de todas as crises. No campo da política económica, esta gente andava ainda há pouco a defender aumento das taxas de juro e, claro, continuam a defender toda a austeridade de que os governos sejam capazes para fazer baixar o salário directo e indirecto de quem está mais exposto. Depois queixam-se do desemprego gerado pela quebra de procura e pedem mais rondas de regressão laboral que os seus próprios estudos põem em causa. Definitivamente, a cooperação e o desenvolvimento não passam por aqui.

2 comentários:

Henrique Gama Pinto disse...

Acho incrível como as "organizações neoliberais" e sua teoria prometem uma repartição do rendimento pela competência e trabalho realizado por cada trabalhador individualmente, mas na prática é apenas distribuir o lucro por alguns, e dar bons salários a quem é "filho de...". E depois dizem que as teorias de esquerda é que são utópicas...

Anónimo disse...

São muitos engraçados estes " conselhos/opiniôes(mas quem é que lhas pede.?)da O.C.D.E.
Mas como cada vez eles(quer os conselhos quer eles mesmos) são mais asnáticos é claro que não se pode acreditar na sua bondade. Bondade, alías, é coisa completamente arredia destes ditos sábios(mas da desgraça).
De todo o modo e a propósito dos elevados salários dos portugueses(em geral altissiomos, como se sabe)cabe perguntar a estes individuos: Afinal quanto é que vocés ganham.!? Quem é que lhes paga os ordenados.!? E vocés também têm o ordenado minimo de 485€ mensais.!? E com isso conseguem sustentar-se( já para não falar de sustentar os v/filhos se os tiverem.!?). Tenho muitas dúvidas mas gostaria de os ver a governar a vida com tal quantia.!.
O neo-liberalismo é mesmo atrevido e fascistoide, disso não tenho a minima dúvida e quanto mais depressa se acabar com ele e com os seus representantes melhor para a humanidade.