segunda-feira, 19 de maio de 2014

O que não fazer

Confesso que foi com surpresa e desilusão políticas que tomei conhecimento da decisão que a associação política Renovação Comunista tomou de apoiar o PS nas eleições europeias. Para uma força que diz querer renovar uma tradição política indispensável, trata-se de uma decisão difícil de compreender e que vai ao arrepio da posição de forças e alianças da mesma área política por essa Europa fora, sejam estas mais ou menos soberanistas e/ou mais ou menos europeístas: da Frente de Esquerda em França ao Partido de Esquerda na Alemanha ou na Suécia, passando pelo Syriza na Grécia ou pela Esquerda Unida em Espanha.

Nas presentes circunstâncias, sendo de eleições europeias, ou seja, de eleições nacionais, que estamos a falar, qualquer apoio à linha política dominante de partidos que deram um contributo decisivo para a construção europeia realmente existente, do Euro ao Tratado Orçamental, não pode deixar de ser recusado. As alternativas passam pela desobediência e pela recusa deste colete-de-forças, o que também implica a derrota democrática das correntes federalistas, como sublinhou o Jorge Bateira.

A invocação vaga de convergências vagas em matéria europeia, todas dependentes de mudanças que não ocorrerão nessa escala, é então manifestamente insuficiente para justificar um apoio ao que quer que seja. Quem se diz marxista tem a obrigação de conhecer o material de que é feita esta integração europeia, com a austeridade e a neoliberalização que nela estão inscritas. Acham realmente que Seguro vai pugnar por qualquer rebeldia desta periferia quando lhe disserem, como lhe dirão, que a austeridade e a neoliberalização são para continuar? Ele já disse o que fará nesta correlação de forças gerada por estas estruturas: Hollande na periferia, ou seja, para pior.

É claro que para lá das questões programáticas, sempre desvalorizadas, há o invocado tabu, que se declara querer quebrar, da unidade da esquerda para um governo. Vejamos: se o apoio ao PS tiver algum impacto político, enfraquecendo as forças à esquerda, gerando uma correlação de forças ainda mais desfavorável, o que é que se espera obter? Mas há mais e pior: a pedagogia da unidade teve no sábado o seu pior exemplo, com um apoio sem contrapartidas, nem agenda programática séria, apenas uma declaração que beneficia Seguro e, repito, a sua linha de praticar austeridade, mas com relutância, enquanto se sonha com mudanças numa Europa feita para as recusar e que mesmo nos seus termos não só não bastam, como, em muitos casos, são contraproducentes.

Tendo em conta o que aconteceu, por exemplo, à refundação comunista em Itália ou o destino do Dimar na Grécia, muito terão ainda mais razões para dizer: se a união das esquerdas é isto, então viva a desunião. O risco do fechamento e do sectarismo dos que acham que a política de alianças entre sectores sociais heterógeneos não passa de uma barganha para uma qualquer secretária de estado pode assim aumentar na previsível lógica do efeito perverso.

A unidade não se constrói multiplicando partidos cheios de ilusões perversas sobre supostas direcções partidárias maléficas e também não se constrói com apoios ao social-liberalismo, ambos de recorte federalista. Creio que a unidade só pode começar, nas presentes circunstâncias, pelo reforço dos, e futura convergência entre os, que estão apostados em desobedecer soberanamente ao consenso de Bruxelas-Frankfurt e em defender o povo português de forma consequente do, deixem-me voltar a assinalá-lo a todos os globalistas, euro-imperialismo.

12 comentários:

João disse...

Aquela coisa em forma de assim ainda mantem os designativos de "refundação" e de "comunista"? É que se assim for, há uma tarefa ciclópoca pela frente: é preciso inventar novas palavras.

Jose disse...

«Frentismo era uma tática endossada por Lenin, onde os comunistas procuraram acordos táticos com os partidos (socialdemocratas) reformistas em busca de uma meta, geralmente defensiva, e limitada.»
A memória do PREC persegue a esquerda e alimenta sonhos húmidos.
Já lá vão 40 anos e mais que PREC foi CERP - Comunistas Em Rota de Perdição; salvou-os o 25NOV75!

Dias disse...

Também me surpreende, pois tinha a RC noutras contas. Parece-me que não querem renovar coisa nenhuma. Saúde!

Luís Lavoura disse...

também passa pela derrota democrática das correntes federalistas

Portanto, para o João Rodrigues só são aceitáveis as candidaturas anti-federalistas, ou seja, nacionalistas.

Eu diria que há bem poucas dessas: o PCP, o MRPP, a AS, o POUS. O João Rodrigues vê mais alguma hipótese além destas 4?

Anónimo disse...

Tanto carinho que os jornais tiveram pelos renovadores - tanto que até criaram os ortodoxos por oposição -. tanto editorial e texto de São José Almeida, de Pedro Correia, entretanto convertido em assessor de Miguel Relvas, e afinal a renovação está feita deste modo.

Obrigado jornais por tantas vezes nos fazerem ver a crise, o buraco europeu e a luz.

Anónimo disse...

Lavoura, não seja tonto e não faça confusões.

V. é físico sabe bem que às vezes pode usar Newton, mas outras tem de recorrer ao Einstein.

Situe-se na constelação ideológica onde João Rodrigues se colocou - a derrota "democrática" das correntes federalistas -e não deturpe, confundido anti-federalismo patriótico com nacionalismos.

R.B. NorTør disse...

O Luís Lavoura esqueceu-se dos que se assumem orgulhosamente nacionalistas, apesar de eu achar que ninguém, nem o Luís, nem o troll, votariam nesses tipos. Bom, o troll talvez...

Quanto ao significado das palavras, como comecei a questionar a validade do meu dicionário aquando da irrevogável demissão, tudo normal.

João Carlos Graça disse...

Sim, vivemos um ambiente em que é de facto necessário reinventar as palavras.
Mais necessário ainda é, porém, fazer aquilo que, por enquanto, só o MRPP e o MAS fazem: proclamar bem alto que o rei vai nu. Ou seja, que é obviamente necessário sair do Euro, e quanto antes.
Sem isso, seja com Passos, com Seguro, ou mesmo com Tsipras/Matias et al., são só mesmo as moscas a mudar...

maria disse...

assim se vê que o PCP tinha razão!!!
o que queriam era acabar com o PCP!!
este Partido sabe renovar as suas gerações e a prova está a vista!!!
manhas antigas... não vai haver um caso na campanha?? que esquisito não haver um maço de cigarros atirado ao assis....

antónio m p disse...

Desiluda-se quem acredita que os partidos ou formações políticas são os seus programas ou proclamações - são as suas pessoas, isso sim. E a "Refundação" foi sempre o palco exigido por alguns actores a quem foi negado protagonismo noutro lugar. Conflitos de arrogâncias...! Que prosseguem agora noutro terreno.

Victor Nogueira disse...

Capucho, joana amaral dias, carlos brito, renovação "comunista", sócrates ... O ps está tão inseguro e de rastos e cisco assis/zorrinho tão desqualificados que precisam de queimar nas europeias "cartuchos" das próximas "legislativas" ?

Anónimo disse...

Victor Nogueira: nem mais

De